Os primeiros votos do ministro so Supremo Tribunal Federal Cristiano Zanin têm agradado a opositores do governo e lideranças evangélicas no Congresso e provocado descontentamento na base e entre militantes de esquerda. Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o ministro tem se posicionado contra temas considerados progressistas e causas sociais, como descriminalização das drogas e equiparação de atos de homofobia e transfobia a crimes de injúria racial.
Os ministros do STF analisam se quem porta maconha para uso pessoal está cometendo crime. Não está em discussão a liberação das drogas ou a descriminalização da venda. O placar está cinco a um pela descriminalização.
O caso é um desdobramento do processo em que, em 2019, a Corte decidiu aplicar a legislação do crime de racismo aos crimes cometidos contra pessoas LGBTQIA+. Uma entidade de defesa da comunidade apresentou um recurso pedindo que a decisão se estendesse a crimes de injúria.
Zanin deu voto contrário com o argumento de que o recurso apresentado não admitia que o mérito da causa fosse rediscutido. Diante da proporção que o caso tomou nas redes sociais, a assessoria do ministro divulgou uma nota, em que afirma que Zanin não é contra o mérito da questão e se pautou por questões processuais técnicas para proferir o voto.
Ele foi acompanhado pelo ministro Luiz Fux. Já os ministros Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia divergiram. Apenas a ministra votou pela aplicação da insignificância. Os outros divergentes abrandaram a pena dos dois homens.
A deputada Erika Hilton (SP), também da sigla, não citou nominalmente Zanin, mas, no momento do voto dele contrário à descriminalização das drogas, pediu “uma ministra negra e progressista no STF”.
Publicamente, parlamentares do PT silenciam, apesar de críticas nos corredores do Congresso e nos grupos de aplicativos de mensagens. Em entrevista ao Estadão, o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR), minimizou as reações e disse que é “muito cedo para fazer uma avaliação” do perfil do novo ministro na Corte e defendeu a atuação do magistrado. “Tenho plena confiança de que ele será um excelente ministro.”
Por outro lado, lideranças da direita se dizem surpresas positivamente com a atuação do novo ministro da Suprema Corte. “Essa decisão das drogas e da homofobia veio bem na esteira do que ele [Zanin] havia falado que são suas convicções morais”, disse o deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), integrante da Frente Parlamentar Evangélica, em referência à conversa com Zanin antes da apreciação do nome dele pelo Senado. “Se continuar da mesma forma, vai ser um ministro do STF com perfil de valores morais adequado ao padrão católico.”
Antes da sabatina que chancelou a indicação do presidente Lula, Zanin se reuniu com membros da bancada evangélica. Na ocasião, ele defendeu que o STF não deveria legislar sobre assuntos como aborto e drogas. O ministro conquistou o apoio da bancada e arrancou elogios da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que foi ministra de Jair Bolsonaro. Depois de almoçar com Zanin, ela disse que “gostou muito” do advogado.
O deputado Eli Borges (PL-TO), também integrante da frente, avalia que, entre os evangélicos, Zanin está “preenchendo a expectativa”. O parlamentar lembrou que o ministro foi aprovado no Senado com o apoio dos conservadores e disse que recebeu “com louvor” a notícia do voto contrário proferido por Zanin no caso da descriminalização das drogas para consumo pessoal. “Ele está conseguindo manter a linha de um conservador. Que Deus o abençoe e que ele continue assim.”
O senador Magno Malta (PL-ES), outra liderança evangélica, gravou um vídeo parabenizando Zanin pelo voto no caso da criminalização da homotransfobia. “Parabéns, é um voto acertado. Pela vida, pelos valores e pelos princípios. Ele não seguiu ideologicamente o que pensam o partido do presidente e seus ‘puxadinhos’.”
Ainda no Senado, Eduardo Girão (Novo-CE) disse que no voto da descriminalização do porte de drogas para consumo pessoal, Zanin foi “coerente e respeitoso com o Parlamento” e “responsável com o Brasil”. O senador votou contra a indicação do ministro e defende que o Supremo mantenha o porte de entorpecentes como crime.
Na sua sabatina no Senado, Zanin disse que via “com otimismo” a revisão do tema da descriminalização das drogas pelo Congresso, mas deu poucos detalhes da sua posição a respeito do tema. Quando foi questionado sobre o que pensava sobre aborto, ele disse que o Brasil já tem um “arcabouço normativo consolidado” sobre o tema e defendeu a proteção do direito à vida. “Nessa perspectiva, temos que enaltecer o direito à vida, porque aí estamos cumprindo o que diz a Constituição da República”, afirmou na ocasião.